quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Assimilação - Vocabulário Piagetiano de Hoje

A primeira expressão usada para designar as teorias de J. Piaget foi "teoria da assimilação". Piaget foi buscá-la na Biologia (todo animal assimila o meio, evidentemente).

Esta expressão designa o fato de que a iniciativa na interação do sujeito com o objeto é do organismo, o oposto do que afirmam os behavioristas que dão primazia ao "estímulo" (meio), apesar de Skinner admitir uma pré-atividade do organismo como condição de aprendizagem ("condicionamento operante").

Isto não significa que Piaget seja um inatista (é por não ser inatista que tanto discute com Chomsky, apesar de Chomsky ser o mais feroz anti-skinneriano atual). Piaget afirma que o "estímulo" só atinge o organismo (a mente), se o organismo (a mente) estiver "sensibilizado" para recebê-lo ("no começo já estava a resposta"). Toda abordagem da realidade supõe um "esquema de assimilação" (fazer um julgamento como "Maria é bonita" é uma assimilação). Mas todo esquema é construído. Construir esquemas de assimilação (no mais alto nível, o esquema de assimilação é, por exemplo, uma teoria) é o que se chama desenvolvimento da inteligência.


Quando o organismo (a mente) assimila, incorpora a realidade a seus esquemas de ação (a assimilação pode deformar a realidade; por exemplo, quando a criança brinca com um pedaço de pau dizendo que é um cavalo). Na assimilação predomina o organismo (o organismo se impõe ao meio). Os órgãos dos sentidos são como esquemas de assimilação anátomo-fisiológicos inatos. Os esquemas - diz Piaget - precisam ser "alimentados". No processo de assimilação o organismo (a mente) não se modifica operativamente (funcionamento). Quando se diz que "Maria é bonita", não se modifica o conhecimento que se tem da realidade. Incorpora-se "Maria" ao esquema "bonito" (encaixe de classe). Quando contamos quantas laranjas há num cesto, usamos o esquema de "contar" para assimilar a situação. Se os esquemas de ação não conseguem assimilar a situação, ou o organismo desiste do esforço, ou se modifica. Esta modificação é o que Piaget chama "acomodação". O equilíbrio entre assimilação e acomodação é a adaptação à situação. Só há "aprendizagem" (aumento de conhecimento), quando o esquema de assimilação sofre acomodação. São as acomodações que constituem o desenvolvimento da inteligência. Se o meio (ecologia) não apresenta problemas, a atividade do organismo é apenas de assimilação.

Diante das dificuldades, o organismo se reestrutura (acomodação) para sobreviver (para continuar a atividade). O organismo (a mente) é um "sistema aberto" que precisa retirar (assimilar) elementos do meio para continuar funcionando. São os problemas que fazem o organismo (a mente) progredir (reestruturar-se). Salvo na atitude lúdica (jogo simbólico), sempre que há assimilação, há também acomodação (o jogo é uma assimilação pura, sobretudo o "jogo simbólico"). A imitação é a acomodação pura: na imitação, o organismo (a mente) se subordina integralmente (tantum quantum) ao objeto (meio). Os esquemas de assimilação mentais, do ponto de vista funcional, comportam-se como o estômago ao digerir o alimento. Os esquemas de assimilação representam a forma de agir do organismo frente à realidade: um herbívoro, por exemplo, não tem esquema para assimilar carne (a carne não o estimula, como alimento - não há sensibilização para a carne). Se só houvesse "assimilação", o organismo (a mente) jamais se modificaria (não haveria evolução e "aprendizagem").

Piaget distingue três variáveis fundamentais na assimilação: a) assimilação repetitiva (reação circular, funcionamento da máquina biológica ou mental); b) assimilação recognitiva (capacidade de reconhecer se a situação é conhecida ou nova: semelhanças e diferenças); c) assimilação generalizadora (capacidade de assimilar elementos próximos não muito diferentes: irradiação). Quando a generalização (irradiação) solidifica-se, transforma-se em capacidade de acomodação (curiosidade, busca de novidade, plasticidade). Como se percebe, a teoria piagetiana é uma teoria geral dos seres vivos (o organismo é um sistema aberto, com capacidade de equilibração majorante ou capacidade de acomodação: o comportamento é o motor da evolução). Para Piaget, a mente funciona estritamente como um organismo biológico ("a função é invariante; a estrutura é que se modifica"). A linguagem (sendo uma "dublagem" da ação) tem as mesmas características da atividade (assimilação, acomodação, estruturação, combinatória, equilibração). A sociedade, segundo Piaget, funciona como um sistema (organismo) de que os indivíduos são subsistemas (subconjuntos).

O formigueiro e a colméia podem ser considerados como organismos, em que as abelhas e formigas são suborganismos.


Desta forma a sociedade, como um todo (como um conjunto de interações) assimila os fatos corriqueiros e acomoda-se aos fatos novos (a introdução de uma nova máquina no processo civilizatório pode exigir uma acomodação). Para Piaget, o fato mais marcante das acomodações sociológicas é a introdução permanente de novas gerações (gerações montantes) no corpo social.



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