Se há uma tendência natural de mentes em formação seguirem exemplos, estamos com sérios problemas. Durante uma semana, ouvi jovens achando formidável uma pessoa na mesma faixa etária ter a possibilidade de ir para São Paulo, num avião próprio, participar de uma festa e voltar para dormir em casa. Mesmo sem ler um único livro até o final, copiando resumos na internet para fazer as provas da escola, pode gastar em uma noite algo como 6 mil reais, que considera uma quantia modesta perto de valores como 60 mil gastos por alguns amigos numa farra. Ou ainda comentar sobre a satisfação que tem com seu corpo, que quando não está absolutamente adequado ao que ele considera perfeito, impede qualquer ação intelectual (sic) de sua parte.
O grave nisso tudo é que, provavelmente, toda essa badalação em torno da figura de Thor de Oliveira Fuhrken Batista , primogênito do homem que ocupa a oitava posição entre os mais ricos do mundo, não passe de uma grande promoção feita para apoiar o lançamento de sua boate Pacha, que será inaugurada em outubro, na Gávea (RJ), ao custo de 11,5 milhões de reais.
O fato é que, se nada há de errado em um país ter milionários desse porte, ainda assim, nas palavras da própria revista, a situação é absolutamente inusitada. Imponderável mesmo. Segundo o texto, “O universo por onde Thor gravita é, de fato, um mundo paralelo, onde a lógica tradicional se encontra em suspenso. Sua estréia à frente dos negócios acontece antes mesmo de ele ter concluído o curso superior – a matrícula do primeiro ano de economia do IBMEC foi trancada porque ele achou o ritmo muito puxado”. Ou ainda, mais adiante: “Ler, definitivamente, não está entre suas preferências. Gosta apenas de textos sobre carros e fisiculturismo”.
É nesse mundo paralelo que vive o Imponderável Thor. Apenas para lembrar, imponderável é “aquilo que não tem peso considerável”, ou seja, o que é indigno de ponderação. E é por esse caminho que vemos outros tantos jovens ávidos por uma chance de repetir o modelo, sem as obrigações intelectuais que elevariam sua condição humana e social, tentando encontrar o atalho para os grandes prazeres, eliminando a necessidade dos sacrifícios que poderiam levar a isso.
O que impressiona é uma revista como a VEJA/RIO, de grande circulação e impacto, tratar do assunto em seis páginas. O conteúdo é tão pífio e a extensão tão grande que realmente tudo leva a pensar numa bem orquestrada ação de marketing, elaborada por profissionais pagos a peso de ouro e com um investimento projetado na casa do milhão de reais. Não há qualquer outro motivo para uma matéria dessas assumir tão grande proporção. E devemos agradecer aos deuses do reino de Asgard, das lendas escandinavas, que não tenha sido veiculado na primeira página da revista principal.
Bem, o fato é que ser o filho do homem mais rico do Brasil não o credencia como o bom exemplo que deva ser seguido por jovens. E ainda é preciso ver que embora a revista pretenda passar a imagem de que tudo dá certo na vida dele, não é assim que a coisa transcorre. Embora ter todo esse dinheiro possibilite a ele ser capa de revistas de grande circulação, falando de seus músculos e de seus tratamentos de beleza, isso não o credencia para ser um ícone aproveitável. Com 45 centímetros de bíceps, tudo o que se pode dizer é que ele provavelmente é fisicamente forte... mas e a inteligência desse rapaz? A quantas anda?
Deve haver alguma coisa errada com quem, nessa idade, nunca leu um livro até o final. Não deve ser transformado em modelo uma pessoa que, sem maiores esforços, consegue gastar em uma noite o que a maioria dos brasileiros ganha em um trimestre ... e ainda acha pouco – segundo sua ótica, existem pessoas muito mais esbanjadoras do que ele. Onde estão os predicados morais desse jovem? O que passa pela cabeça dele, além daquilo que a reportagem diz? Alguém está preocupado com isso?
A MORAL deveria ser uma coisa bem desenvolvida na idade dele, mas não existem sinais disso em seu discurso – ou no discurso montado para ele. Quando diz que é muito econômico nas suas noitadas, parece um disparate frente a realidade do país em que vive, mas isso não é salientado. Frente ao salário mínimo do país, é um total despautério sua colocação de que “a gente tem uma vida de luxo sim, mas não esbanjo dinheiro”. Onde estão seu pai e sua mãe numa hora dessas, para informar a seu filho de que nesse Brasil enorme, existem pessoas que vivem na miséria mais absoluta, e tão excluídos que o Governo Federal está agora querendo montar um mutirão para saber onde estão! São pessoas que escapam a qualquer nível de controle social porque nascem, crescem, vivem e morrem sem uma certidão de nascimento, sem um registro, sem nada. Brasileiros que vivem em regiões tão remotas que não contam com qualquer assistência mínima. Consciência leva a melhoria do nível de moral, mas não é o caso. Assim, mesmo que de forma cosmética, não há menção de um trabalho social no seu discurso, e isso seria uma dádiva para um país que precisa tanto de distribuição de renda e de ações altamente eficazes no âmbito da responsabilidade sócio-ambiental.
Uma bofetada no sistema escolar é saber que uma pessoa tão rica e com tanto poder na mão, pode ter passado por ele sem nunca ter lido um livro. E que se valeu do sistema supletivo para concluir aquilo que demanda anos de esforço para o comum dos mortais. Como é que ele chegou ao primeiro ano de Economia? Claro que ele deve ter achado muito puxado fazer o primeiro ano de faculdade, e por isso trancou a matrícula. Mas a lição que fica é a de que, tendo dinheiro, o sujeito “ou vai ou vai”, e que a falta de estudos não faz a menor diferença para ele nem para os seus pares ou mesmo seus pais. O fato é que não é possível um indivíduo ter chegado a universidade sem nunca ter lido um livro. Em um esquema educacional responsável, isso seria impossível.
A situação é de um nonsense tão absoluto que os comentários ficam vazios. Comentar o nada, é o mesmo que enfrentar o vento. O perigo do vento é que, quando ele é muito poderoso, provoca destruição sem tamanho. O contrário também é verdade, ou seja, se o vento for forte, tiver direção e constância, pode empurrar navios por distâncias consideráveis, como aconteceu com os barcos vikings que, em determinada época, dominaram o mundo conhecido e descobriram novas terras e riquezas. É lastimável que o detentor do nome de um poderoso deus da mitologia daquele povo não use seu “martelo” para abrir caminho para o seu povo. Mas como culpá-lo? Ele é o resultado de sua educação.
Sem sombra de dúvida, existe um mercado de luxo para pessoas que ultrapassaram aquele ponto mágico dos bilhões em suas contas bancárias, e que esse mercado se alimenta do imaginário das pessoas comuns que veneram o poder oriundo dessa condição. É fato que apenas a ponta do topo da pirâmide social ali se encontra, minguados milhares de brasileiros que podem se dar ao luxo de comprar um carro de um milhão de dólares, uma aliança de 30 mil reais, um relógio de 50 mil reais ou coisas assim. O que não se pode é tornar uma pessoa sem qualquer formação consistente num ídolo para seus pares que estão na juventude, formando seu caráter e tomando como base o fato de que, mesmo não estudando, é possível ser feliz. No mundo para o qual estamos caminhando em velocidade crescente, nada mais falso do que isso. Salvo para os deuses de Asgard, como o Imponderável Thor.
7 comentários:
O artigo de hoje da Beta no seu blog é de uma importancia sem igual, é um grito que todos, t-o-d-o-s os brasileiros devem ler e meditar. E isso é papel nosso. Temos de retransmiti-lo aos cuatro cantos do país. Os que se sintam com um dever moral ante si mesmo e o país; os que se sintam afligidos ante o futuro do ser humano em geral, devem retransmitir esse artigo a todos os seus contactos.
Beta e demais amigos: todos nós sabemos que não somos nada, e nem nos constituimos como sujeitos unos, unicos e plenos, sem "nossos outros". Chamo de outros aos adultos, amigos e todos aqueles que nos incitam a ver a vida de um outro prisma, aqueles qeu nos questionam ou nos apoiam mas que cobram o reconhecimentoda existencia de "outros oculos", de tantos outros modos de ser, de sentir e de viver. Num país como o nosso, táo bem descrito pela Beta, extremamente desigual, penso nos possíveis pares, nos "outros" dew referência desse menino-homem Thor. Quem são, ou seriam, ou deveriam ser os "seus outros"? Quem será que lhe convida a ver o seu entorno de um modo diferenciado, onde as regras são outras? No entorno, o(s) caminho(s) e o sucesso podem vir a ser aprendidos/ ensinados/construídos através do estudo, da lealdade, da parceria que envolve a capacidade de conhecer, respeitar e propor mudanças nesse mesmo entorno social. Nesse processo a vivência escolar em todos os niveis é imprescindivel e seus frutos extrapolam os conhecimentos acadêmicos, digamos assim. Quem sao seus pares, desiguais? Pai e mãe? Sua família? Que amigos podem compartilhar esses valores e desejos? Seria ele um icone a ser destacado pela imprensa brasileira ou mais um jovem supostamente solitário já que exibe padrões de uma cultura material da felicidade que é muitíssimo restrita, questionável e fugaz? Apesar dore conhecimento de um relativo conforto que o dinheiro possa proporcionar, como mãe e educadora o meu sentimento é de tristeza. Maria Ines de C. Delorme
Odorico, vc é o Odorico com quem trabalhei na Chave, no final da decada de 70?
Oi Maria Inês, olha eu trabalhei na Chave, sim, em 1978 e parte de 1979. Depois vim para a Venezuela, aqui me estabeleci e já nao soube de mais ninguém. E você?
Oi Inês,acho que naquela época eu te chamava assim, Inês. Você estudava matemática??
Oi Inês, pensando melhor, acho que era sua prima quem estudava matemática. Era?
Nada mais real que isso, Beta ... No mundo de hoje pouco se lê! O que vigora é o dinheiro e o "sentir-se legal"! Thor é filho de Luma - a rainha do carnaval com direito a coleira - e de Eike, um homem sobre o qual não conseguiria, sem algumas palavras fora do contexto, dizer o que penso! Esse o mundo dos multimilionários! Desde sempre! Thor é fruto, Beta! Thor não é a colheita... Dito isto penso que não há mais a dizer!
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